* Josias Gomes –
Baiana, natural da brava Paulo Afonso
Ela nasceu Maria Gomes de Oliveira, ficou conhecida como Maria de Dea acréscimo que veio do nome de sua mãe, como é costume no nordeste. No entanto, depois de seu assassinato, passou a ser Maria Bonita. É verdade, só depois de sua morte é que ela recebeu esse nome. Incrível, não?
Se estivesse viva, Maria Bonita completaria hoje 111 anos. No mesmo dia do seu nascimento, 55 anos depois nos Estados Unidos, nascia Michelle Obama que veio a ser anos depois a primeira-dama norte-americana.
O cangaço já foi objeto de vários estudos sociológicos, históricos, mas ainda acho que o tema é objeto de interpretações de vários estudos pouco esclarecedores do momento em que ocorreu o fenômeno, onde a lei era o “olho por olho, dente por dente” vigente no nordeste. Não sei, mas ainda cabem estudos que dêem conta de forma mais profunda qual o mundo político nordestino da época e seus atores principais. O tema precisa ser socializado para entendermos, inclusive, os movimentos libertários que se seguiram na região, a exemplo das lutas campesinas.
Desde a adolescência, me interessei pelo tema, o primeiro livro que li sobre o cangaço foi Lampião, Cangaço e Nordeste de Aglae Lima de Oliveira, isso quando ainda estava no Ginásio Agrícola de Escada no início dos anos de 1970. O aprendizado adquirido no livro me valeu o direito de responder sobre Lampião num programa que a direção do Ginásio fazia semanalmente, imitando a rede Tupi, que tinha um programa onde o apresentador Jota Silvestre entrevistava uma pessoa sobre uma personalidade, até o mesmo cometesse um erro de resposta.
Aglae respondeu durante meses sobre Lampião, eu assisti a todos os programas. Depois continuei lendo muito sobre o tema, mas confesso que é necessário mais estudos.
Recentemente, o tema da mulher no cangaço tem sido objeto de estudos que valem a pena serem lidos, a maioria é biografias, mas contextualiza muito bem a presença das mulheres no cangaço.
Para conhecer e compreender a razão e o porquê de mulheres de ingressarem no cangaço, torna-se indispensável a leitura destas novas publicações.
No entanto, hoje é dia de relembrar a mais importante mulher cangaçeira, a rainha do cangaço. Foi casada com Zé de Neném, natural de Santa Brígida, – terra do meu companheiro Gordo de Raimundo- abandonou o marido pra se unir ao rei do cangaço. Alguém naquele mundo de meu Deus brigaria com o “homi” pela posse de Maria de Dea?
A história do Cangaço explica o mundo de opressões que vivia os nordestinos.
Lampião e o seu bando de valentes não foram meros assassinos. Foi um homem do seu tempo que não aceitou o assassinato do seu pai, nem a usurpação da pequena propriedade de terra. Lutou como um Dante, errou como qualquer um erraria naquelas condições opressoras.
É preciso entender as razões políticas e econômicas para se fazer justa análise das inúmeras atrocidades praticadas pelos cangaçeiros e seus perseguidores – as tropas oficiais- já documentadas e do conhecimento geral. É tanta riqueza histórica que precisamos nos debruçarmos pra entender a capacidade que o comandante Lampião exercia no Nordeste e fazia temer o poder Federal. Tanto que foi condecorado pelo estado como Capital Virgulino, o objetivo era jogar o cangaço contra a Coluna Prestes, fato que não ocorreu mas que serviu pra receber armamento moderno.
Também carecemos de mais explicações sobre o fato de Lampião ter uma série de coiteiros, dentre eles, governadores, latifundiários, policiais militares. Talvez essa conjuntura nos alertem para um fato: a revolução de 1930 com suas ambiguidades, mas que tenha vindo pra modernizar o país e em grande parte o fez. Apesar de manter a mesma estrutura social que bem poderia dar fim nesse país que era e continua sendo tão desigual. Getúlio se tornou um ditador que navegou na onda autoria dos anos Hitler/ Mussolini.
Igual aos dias atuais, onde somos mais uma vez, um país refém de uma onda antidemocrática patrocinada por um déspota que contou com apoio da direita e de grande parte da mídia.
E a essa altura, na há nordestino cabra da peste que não diga: ah, Lampião que faz falta!
Mesmo que a afirmação acima seja exagerada, é inegável que devemos beber da fonte de coragem de Lampião e Maria Bonita, usando os meios democráticos para subvertermos a opressão do desgoverno que consegue ser mais violenta do que os tempos do Cangaço!
*Deputado Federal do PT/Bahia licenciado e atualmente titular da Secretaria de Desenvolvimento Rural (SDR).