“Não se brinca com símbolos identitários”, diz pós-doutor em Antropologia sobre “acarajé da Barbie”

19 de julho de 2023, 11:47

Acarajé rosa divide opiniões nas redes sociais (Foto: Reprodução)

O acarajé rosa, feito por Adriana Ferreira dos Santos, mais conhecida por ser a dona do ‘Acarajé da Drica’, que viralizou nas redes sociais, virou polêmica na capital baiana.  Apesar de algumas pessoas terem gostado da ideia, que faz referência ao filme sobre a boneca Barbie, que estreia nesta semana, o acarajé também foi alvo de críticas, inclusive da Associação Nacional das Baianas de Acarajé (ABAM).

Através das redes, a entidade afirmou “repudiar veementemente” qualquer pessoa que se “aproprie das nossas iguarias ancestrais, desfazendo do seu formato, modo de feitura e representação sagrada”, afirmou. “Acarajé não é moda, ‘trend’ ou efemeridade. Acarajé é comida sagrada e mercê respeito”, defendeu a entidade.

Quem também não aprovou a novidade foi o pós-doutor em Antropologia, babalorixá e estudioso da comida de Santo, Vilson Caetano. Na avaliação dele, fazer o acarajé rosa “não foi algo positivo” e não foi uma “feliz escolha”.

“Por que não se pensou em algo para agradar a memória dessas mulheres e dessa população negra que foi dispersa pelo novo mundo? Porque isso é negado. Eu acho que uma das coisas que temos que refletir, é que não se ‘brinca’ com símbolos identitários. O acarajé é a comida mais preservada fora do continente africano por nós, aqui em Salvador, e que resume a história de homens e mulheres, sobretudo de mulheres, que enfrentaram o processo de escravidão através da venda nas ruas, imprimindo significados nas ruas”, afirmou ao Portal M!.

Ainda conforme o professor, o ato de “omitir ou incorporar outra cor” é uma maneira de “negar a história dessas mulheres” que, ao longo do tempo, tiveram o acarajé como símbolo de poder.

Vilson Caaetano é autor de livros
sobre comida de Santo

“Eu fico me perguntando a quem interessa o acarajé rosa. Acho que a gente não precisa agradar a Barbie, o que a Barbie acrescenta na vida da população negra, das mulheres e homens negros? Acho que o contrário, a Barbie sempre nos impactou muito negativamente. É uma boneca magra, loira e que nada tem a ver com nossos corpos. Então acho que foi uma recriação infeliz, que só teve a pretensão da novidade, mas é uma novidade negativa e que, de fato, não tenho dúvidas de que, a partir do momento que se traz essa alteração e associa com essas outras visões de mundo, passa a ser outra coisa e deixa de ser o bolinho de feijão”, ressaltou.

Autora se defende das críticas

Vendedora de acarajé e abará há 15 anos no subúrbio de Salvador, Drica é conhecida por sempre usar o “diferencial” nas suas vendas. Há seis anos ela se tornou conhecida na região por vender acarajé e abará na barca de sushi. Mas, desta vez, apostou no acarajé rosa, em homenagem à estreia do filme da Barbie.

Em pronunciamento nas redes sociais, Drica ressaltou que não fez algo “prejudicial”, e que manteve as características e o sabor do acarajé.

“Jamais eu vou fazer algo prejudicial, seja ao meu produto ou a característica do meu produto. O acarajé rosa é pela homenagem que todo o mundo está fazendo à estreia do filme Barbie. Não mudou o sabor do acarajé, é o mesmo sabor, a única diferença é que contém três gotas de anilina na massa, somente para dar cor, como tem bolo rosa, coxinha rosa, pizza rosa e hamburguer rosa. Então gente, menos, é um trabalho de marketing, mas não modificando a característica e sabor”, observou.

Ela também ressaltou que não é baiana de acarajé, mas sim “vendedora”, e destacou que esse foi um “jogo de marketing” para mais pessoas conhecerem seu projeto. “Repercutiu bastante o meu bolinho de feijão rosa, porque eu não sou baiana de acarajé, sou vendedora de acarajé. A gente tem que ter a criatividade, então eu usei a minha. Meu jogo de marketing, é o meu jogo de criatividade, para eu atingir meus clientes, para as pessoas conhecerem o meu projeto e eu vou ser assim a vida toda”, disse.

A vendedora também anunciou que seguirá com os quitutes rosa até quinta-feira (20) e garantiu que as pessoas terão o “melhor sabor”.

“A pedido de vocês, até quinta-feira, eu vou ter combo pink, bolinho de feijão pink e vocês vão ver, que terão o melhor sabor, porque eu trabalho com qualidade, com mercadoria boa e com amor, eu faço por amor. Se é pink, se é branco, se é preto, a cor que vocês quiserem, a gente vai atender vocês e tratar bem”.

Potal M (Muita Informação)