Aldery

08 de agosto de 2018, 13:41

Por Marcelo Rodrigues

 

Noite passada, sonhei com Aldery. No sonho, alguém me dizia que ele já se encontrava com oitenta e cinco anos, uma vez que seus cabelos estavam totalmente brancos e o seu corpo encolhera. Mas eu estranhava essa observação, pois acreditava que a sua idade não fosse além dos sessenta anos. Tudo bem. Era apenas um sonho.

Há muito tempo que estive com Aldery. Na última vez que o vi, ele já era um homem derrotado, que perdera tudo: o patrimônio, os amigos e principalmente qualquer crença na vida e nas pessoas.
Conheci-o em 1981, quando morava em Natal, na casa do meu irmão mais velho, no ensolarado bairro de Ponta Negra. Aldery fora nos apresentado pela minha cunhada. Naquela ocasião, ele possuía um bom emprego na loja de roupa do seu pai, no centro da cidade, era um rapaz forte, bonito e extremamente agradável. As suas visitas eram sempre aguardadas, pois sempre nos trazia deliciosos lanches. E nos restaurantes em que íamos, ele sempre se antecipava e pagava a conta. Até com livros luxuosos da sua biblioteca particular ele nos presenteava, se por acaso percebesse algum interesse nosso por qualquer volume. Assim, todos os finais de semana, ansiávamos pela sua vinda, que era, especialmente para mim, sinônimo de fartura e diversão.
Um dia, o pai, acreditando que fazia um bom negocio, desfez-se da rentável loja da família e partiu para o interior da Bahia, levando consigo o nosso querido amigo. Depois de um ano, porem, inseguro e com o patrimônio comprometido, Aldery retornou. Jamais se encontraria novamente. Aventurou-se em vários negócios, onde sempre perdia dinheiro. Por ultimo, vendeu seu único imóvel e, após desastrosos investimentos comerciais, terminou por ir morar de favor na casa da sua mãe.
Por essa época, eu tinha sido aprovado no concurso para a academia militar e logo fui embora para São Paulo. Algum tempo depois, o meu irmão também sairia de Natal. Poucas vezes retornaria ao Rio Grande do Norte para reencontrar o nobre Aldery. Isso já faz muitos anos.
E, na última noite, sem que há muito o lembrasse, sonhei com ele. No sonho, parecia realmente velho, mas a minha angústia não vinha tanto da sua velhice precoce, mas de vê-lo, antes jovem, bonito e generoso, pronunciar frases ininteligíveis. E no esforço que fazia para se comunicar, eu compreendia que apenas mendigava algum dinheiro para que pudesse se embriagar ainda mais.

Salvador, maio de 2018

 

antomarcelo@gmail.com

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