‘Bacurau’ é uma ode à força do povo nordestino

22 de agosto de 2019, 11:47

(Foto: Reprodução)

Bacurau começa com um funeral. Por mais triste que o momento seja, não há nada mais aglutinador para uma família, e, no caso do filme, para uma comunidade, do que a despedida de alguém. A passagem é o primeiro indicador do que o filme de Kleber Mendonça Filho Juliano Dornelles se trata: identidade e pertencimento, a sua importância e a consequência da falta deles.

Funeral de Carmelita, cena de ‘Bacurau’

Foto: Victor Jucá / Divulgação

E não se trata da morte de qualquer pessoa. É Carmelita, uma senhora de 94, uma espécie de guardiã de Bacurau, uma cidade do interior do sertão de Pernambuco. Ela representa as lutas, as conquistas e as carências da cidade, de um povo sofrido. É evidente a falta de cuidado que a cidade tem, assim como a existência de suas próprias leis. 

Existe o professor, filho de Carmelita (Lia de Itamaracá), Plínio (Wilson Rabelo), pai de Teresa (Bárbara Colen), protagonista que nos guia a Bacurau. Uma cidade fictícia, mas que existe de verdade — para as filmagens do filme, Barra, no sertão de Pernambuco, foi usada como cenário. Não se sabe a data exata que a história se passa, somente que é um futuro recente. 

Ao lado de Teresa está Pacote, personagem de Thomás Aquino, ou Acácio, como prefere ser chamado agora, já que preferiu deixar a vida de bandidagem para trás. Em Bacurau tem também a médica Domingas, interpretada por Sônia Braga, que, como era de se esperar, entrega grandes cenas. PlínioTeresa Acácio cuidam da cidade e dos moradores, à sua maneira. Bacurau ocupa uma rua e funciona dentro de sua própria lógica e lei.

Sônia Braga como Domingas em 'Bacurau'
 
Sônia Braga como Domingas em ‘Bacurau’
Foto: Cinemascópio / Divulgação
 

Até a chegada dos forasteiros. A cidade vira alvo. O caminhão pipa que a abastece chega cheio de furo de balas, o sinal de internet é bloqueado, drones fazem a vigilância da região e pessoas são assassinadas. Não se sabe quem está atacando a cidade, mas os moradores fazem o que sempre souberam fazer: se unem e chamam, inclusive, Lunga, papel de Silvero Pereira, o bandido procurado. Em terra de prefeito corrupto e negligente, “bandido” que luta pelo bem dos moradores é herói. 

Por um bom período do filme não se sabe quem está por trás dos ataques. E é indiferente. O poder de Bacurau está na força dos moradores dessa cidade fictícia, que muito bem representa o nordestino. Ao mesmo tempo, é escancarado uma deficiência brasileira em conseguir criar raízes com a sua própria identidade. Perceba, leitor, quando for assistir ao filme, a síndrome do vira-lata na cena em que interagem os forasteiros brasileiros e os demais. E quando eles não se encontram como brasileiros, eles não só se voltam para os seus, como viram alvos fáceis para os outros. 

Na ponta contrária, por mais carente que seja a comunidade de Bacurau, foi a certeza de quem eram, de sua história, que os mantiveram a salvo. Foi no museu da cidade que eles encontraram como se proteger. Quer mensagem mais forte do que essa? Encontrar na nossa história como continuar e ter chances no futuro. 

Mesmo que Kleber Mendonça Filho faça questão de salientar que não planejou Bacurau para passar uma mensagem, como disse durante a coletiva do filme, é muito difícil vivenciar o longa sem passar por uma explosão de sensações. E o grande sentimento de que se sai é de que ser brasileiro, por fim, é o que vai nos manter vivos. 

 

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